Para a nova temporada de Emily in Paris (Emily em Paris), a plataforma de streaming juntou-se ao Google para possibilitar o uso da ferramenta Lense, que permite fotografar a tela e conduzir o usuário para o site em que são vendidos os cosméticos, as roupas e os acessórios usados pelos atores. O número de cliques vem crescendo vertiginosamente, assim como o valor das comissões faturadas com "essa nova forma de engajamento", explica a Netflix em um comunicado. Criando uma espetacular narrativa dentro da narrativa, as operações comerciais acompanham os anseios das personagens.
O enredo da série, astuciosamente elaborado, gira em torno de Emily Cooper, uma americana que se muda para Paris. A jovem é encarregada pela "Savoir", uma fictícia agência de marketing de luxe, de inventar parcerias inovadoras para as mais variadas marcas que, por sua vez, nada têm de fictícias.
"É um fenômeno muito comum no mercado americano: as marcas são incorporadas à narrativa desde a fase de elaboração do roteiro, e as agências de marketing pagam valores extremamente altos para que os produtos entrem na trama", explica à AFP Jean Dominique Bourgeois, diretor da Place to Be Media, agência francesa especializada em merchandising de produtos.
"O investimento, que fica entre 500 mil e um milhão de euros pela inserção de um produto numa cena, acaba sendo um bom negócio para as marcas, que precisariam desembolsar valores muito maiores se quisessem divulgar suas campanhas em vários países", explica o especialista, cuja agência desenvolveu a parceria entre a série Emily e a rede McDonald’s na terceira temporada, além de ter posicionado três outros clientes na quarta temporada.
Um amplo leque de clientes
A Vestiaire Collective, plataforma de roupas de luxo usadas, viveu seus minutos de glória quando a melhor amiga da protagonista, Mindy, recorreu aos serviços da empresa para vender suas peças de grife, pois precisava de dinheiro. Toda a operação foi filmada nos mínimos detalhes.
Numa entrevista à AFP, a empresa francesa não quis revelar o valor da operação, mas afirmou que o objetivo foi buscar "a notoriedade da marca", em especial "a expansão no mercado americano, que atualmente responde por 20% das vendas".
A empresa de moda, que oferece também 900 referências inspiradas no guarda-roupa de Emily, diz ter constatado um "aumento" do número de novos clientes, tanto dos que compram como dos que vendem. Os modelitos da protagonista da série, que a cada temporada ficam mais e mais extravagantes, têm ótima saída.
As marcas de cosméticos também pegaram esse trem. A Milk Makeup, por exemplo, deu um jeito de posicionar seu Lip + Cheek stick, blush cremoso e batom dois e um, no banheiro de Emily. O produto aparece de forma bem visível no trailer da quarta temporada e no terceiro episódio.
Paralelamente, a Essence, marca de maquiagem popular do grupo Cosnova, criou uma edição limitada inspirada nos visuais de beleza apresentados na série.
"Um imenso centro comercial"
Com suas escolhas audaciosas, Marilyn Fitoussi, figurinista da série, transformou o guarda-roupa da protagonista americana numa personagem à parte. O resultado é que cada figurino vem sendo esmiuçado nas páginas das revistas de moda, como acontece após um desfile de alta-costura. Tudo parece muito bem calculado na escolha do ângulo que dará mais visibilidade ao símbolo da Louis Vuitton na fivela de um cinto, ou à marca dos trajes usados pela heroína para se exercitar.
"Assistir à série nos deixa com a estranha impressão de perambular em um gigantesco shopping center", comenta o jornalista Adam Sanchez, da revista masculina GQ.
O especialista em cultura e cinema ressalta que o uso desse recurso "aumentou exponencialmente" na quarta temporada, que logo nos primeiros minutos do primeiro episódio apresentou quatro produtos. Os espectadores, garante ele à AFP, mergulham de cabeça no princípio "me engana que eu gosto", sem medo de ser feliz. "Estamos diante de uma experiência sem equivalentes: na verdade, os espectadores não acompanham a série pelo roteiro, que é bem minimalista, mas pelo que Emily, a protagonista, consome e usa", resume Adam Sanchez.