Um exemplo que ilustra bem esse problema é o "Iso E Super": presente na proporção de 20% a 40% em praticamente todas as fórmulas de perfumes (tanto perfumaria fina como fragrâncias funcionais), esse derivado de terebintina é muito importante para o setor, sendo usado mais ou menos como um solvente que se adapta a qualquer tipo de fragrância: notas amadeiradas, almiscaradas, etc. A produção, que atinge milhares de toneladas e tem custo irrisório, é realizada por fábricas situadas principalmente na Índia (incluindo um fabricante francês, a DRT). No início deste ano, os dois principais fornecedores da indústria tiveram suas fábricas destruídas pelo fogo a poucos meses de intervalo, deixando à míngua todos os fabricantes de fragrâncias, que foram obrigados a procurar seus próprios clientes (L’Oréal, P&G, Unilever, Coty e outros) e propor modificações nas fórmulas existentes, a fim de compensar a ausência do famoso ingrediente que subitamente desapareceu do mercado.

A Agilex publicou um interessante comunicado sobre essa questão em seu site: www.agilexfragrances.com

Por trás desse exemplo, que à primeira vista pode parecer insignificante, se esconde uma realidade muito mais ampla. A indústria de perfumes vem registrando um belo crescimento, o que significa que a pressão sobre as matérias-primas, em particular as sintéticas (que, por serem mais baratas, são cada vez mais utilizadas), também vem crescendo. A concentração da indústria observada nos últimos dez anos gerou gigantes do mercado: uns poucos grupos controlam mais da metade da indústria mundial, tanto no campo dos fabricantes de fragrâncias como no campo dos clientes desses fabricantes (grupos do setor de perfumes e cosméticos). Graças a seu imenso poder de compra e ao volume de negócios que eles movimentam, esses grupos conseguem exercer uma pressão fenomenal sobre os preços, impondo suas tarifas aos fabricantes de ingredientes para o setor de perfumes. O resultado é que a maioria dos fabricantes acabou fechando as portas, deixando o mercado nas mãos de um punhado de empresas das quais toda a indústria depende para sobreviver.

Não é preciso ter bola de cristal para compreender que, nos próximos anos, esse tipo de situação vai se agravar ainda mais, pois na maioria dos segmentos estratégicos (em particular o de ingredientes sintéticos, que representam a maior fatia da produção), as moléculas são fabricadas por um pequeno oligopólio. Se algum desses fabricantes tiver um problema, por menor que seja (abastecimento de matéria-prima, capacidade de produção, crise política, econômica ou ambiental, etc.), a indústria inteira estremece.

A conclusão é evidente: de tanto querer fazer economias para aumentar os lucros graças à diminuição dos custos, esses gigantes do setor acabam se fragilizando ao destruírem, eles próprios, parte de suas fontes de riquezas.

As chances são grandes de que os executivos de compras (CPOs) tenham muitas noites em claro pela frente, visto que, no final das contas, toda a estratégia de compras precisa ser repensada a fim de garantir a regularidade do abastecimento para os clientes. É muito simples calcular o impacto do preço de um ingrediente, mas qual é o impacto financeiro global desse tipo de crise para uma empresa? Que eficácia têm as estratégias adotadas para reduzir os riscos em matéria de abastecimento de ingredientes? E como fica a obrigação de informar e o dever de transparência em relação aos ingredientes contidos nas fórmulas das fragrâncias?

Quanto aos ingredientes naturais, o problema é outro: trata-se de produtos cultivados, ou seja, que não saem das linhas de produção de uma fábrica – mas não podemos esquecer que eles têm um impacto para o setor agrícola. O resultado em relação à disponibilidade dos produtos é muito semelhante, mas por razões diferentes. Quer dizer, em parte.