Para ajudar as marcas nesse desafio e fornecer a elas pistas sobre o que pode ser feito em 2022, Eva Lagarde, fundadora da empresa de consultoria e capacitação Re-Sources, identificou cinco tendências em matéria de embalagens para este ano.
Novos materiais sustentáveis
Pouco importa que sejam coprodutos das indústrias agrícola ou alimentar (frutos do mar, cogumelos, coco, bambu, cana-de-açúcar etc.), do setor de florestas (madeira, cascas etc.) ou resíduos de cerâmica: uma infinidade de novos materiais estão invadindo o universo das embalagens.
Esses materiais são interessantes pela dimensão inovadora que eles conferem e pela riqueza que oferecem para o storytelling. Há muito o que dizer aos consumidores sobre os novos compostos com que são fabricadas as embalagens. Primeiramente, o fato de que essas soluções vão na contramão dos derivados de petróleo, dos microplásticos, do lixo no oceano e de todo o resto; em seguida, o aspecto tecnológico e natural que, por si só, é uma história cativante.
A título de exemplo, a TheShellworks desenvolve atualmente novas embalagens a partir de um polímero digerido por bactérias. Com certificação de substância 100% biodegradável, o polímero se degrada numa composteira industrial em aproximadamente cinco semanas. A empresa já oferece o produto em dez opções de cores, entre as quais gelo, laranja-mandarina escuro, azul-marinho, preto etc.
Outro bom exemplo é a Chanel, que utiliza, em algumas embalagens, polpa moldada à base de fibras de bambu e de bagaço de cana, desenvolvida pela Knoll Packaging. Mais recentemente, a empresa decidiu usar, nos produtos da linha Chanel n°1, tampas de biomassa fabricadas pela Sulapac com 90% de materiais de origem natural, sendo 10% de produtos derivados de camélias. Uma iniciativa interessante, sem dúvida, principalmente por vir de um grande nome do setor de luxo, o que provavelmente será um incentivo para que outras marcas adotem materiais alternativos.
É bom lembrar que esses novos materiais podem ter limitações em termos de forma, acabamento, cor ou opções de decoração. Além disso, integram um novo fluxo de reciclagem que geralmente envolve a compostagem industrial (embora o processo de degradação seja finalizado na natureza) e podem prejudicar o atual fluxo de reciclagem de plásticos, caso sejam descartados nesse canal. Portanto, é muito importante fornecer informações e orientações claras aos consumidores, a fim de otimizar o fim do ciclo de vida da embalagem.
A revolução do refil
Existem três maneiras de implementar um modelo de refil.
A primeira consiste em ter um sistema que ofereça duas referências nas lojas: por um lado, um recipiente no qual será colocado o produto; por outro, um saco pouch (ou outro tipo de formato) para o refil. Muitas marcas desenvolveram essa ideia, como Tata Harper, Fenty Beauty, Charlotte Tilbury e L’Occitane, entre outras.
O segundo modelo tem como base uma estação de refil disponível nas lojas e embalagens vazias destinadas a receber o produto. Esse tipo de modelo funciona bem com produtos enxaguáveis, em que há menos risco de contaminação da fórmula. Algumas marcas já adotaram esse tipo de sistema, como The Body Shop (no mundo todo), Re (no Reino Unido), Algramo (no Chile), The Refillery (nas Filipinas) e Mustela (na França). Para os produtos de cuidado da pele sem enxágue, a marca francesa Cozie desenvolveu um dispositivo que mantém a fórmula em condições herméticas durante o envase e imprime um número de lote, a fim de cumprir com as exigências regulamentares. A empresa disponibiliza esse sistema para outras marcas e vem desenvolvendo uma cadeia logística global para a coleta, a limpeza e a devolução das embalagens.
O terceiro modelo consiste em oferecer um sistema de assinatura com o qual os consumidores recebem um refil periodicamente. Algumas marcas, como 900.care, What Matters, Izzy e Wild, já aplicam o modelo. Na esteira dessa tendência, muitas marcas começam a oferecer produtos com base em soluções extemporâneas, em que o consumidor compra um pacote de pastilhas e reconstitui a fórmula em casa, adicionando água.
A revolução do refil está a caminho, e com o advento de novas leis que proíbem o uso de plásticos descartáveis, é muito provável que, num futuro próximo, vejamos um grande número de iniciativas inéditas nesse segmento. Os consumidores talvez precisem de tempo para incorporar os novos hábitos, e os varejistas também precisarão se adaptar, pois a novidade gera problemas de espaço, custo e logística. A cadeia de abastecimento também terá que reorganizar seu funcionamento, a fim de garantir às lojas um fornecimento adequado de fórmulas "a granel". Em suma: enquanto não forem implementados sistemas padronizados, vai ser complicado para as marcas desenvolver plenamente esse modelo.
Gestão do fim da vida útil
Atualmente, apenas uma pequena porcentagem das embalagens do setor de beleza entra no circuito de reciclagem. Os argumentos são sempre os mesmos: quando não são "pequenas demais", são "complexas demais" (várias camadas de materiais diferentes, mistura de materiais etc.) para serem recicladas. Mas, para atender às normas que proíbem determinados componentes na embalagem, priorizam determinados fluxos de materiais ou impõem uma porcentagem de conteúdo PCR, será necessário chegar a um novo acordo para reciclar as embalagens da indústria de beleza.
Com o objetivo de coletar e gerenciar o fim do ciclo de vida útil dos produtos, as marcas de cosméticos têm trabalhado em colaboração com organismos especializados. Nos Estados Unidos, por exemplo, a Credo Beauty coopera com a Pact Collective, enquanto a L’Occitane e a Garnier estabeleceram uma parceria com a TerraCycle. Também nos Estados Unidos, um grupo de marcas trabalha atualmente na análise de pequenos formatos, a fim de otimizar a reciclagem.
Mas isso não será suficiente. Para garantir que o ciclo de vida se termine como previsto, uma possibilidade seria implementar soluções inteligentes nas embalagens, apresentando instruções de uso e reciclagem. Com a entrada em vigor das novas normas, será difícil imprimir tudo na própria embalagem, que por isso deverá incluir elementos inteligentes, como QR codes ou chips NFC.
Outra maneira de gerenciar resíduos é eliminar todas as embalagens que não sejam essenciais, optando por soluções monomaterial adaptadas aos canais de reciclagem atuais e evitando materiais que, ao final da vida útil, não sejam estritamente controlados no mercado. Muitos fabricantes de embalagens oferecem soluções inovadoras. Mas o que fazer quando não existe uma cadeia de reciclagem organizada na região em que a empresa deseja vender seus produtos? As marcas continuarão a explorar esse terreno e, em alguns casos, trabalharão de mãos dadas com os fornecedores para desenvolver soluções seguras.
"Papelificação" e "madeirificação"
O papel (ou papelão), material obtido a partir de madeira, é uma solução muito interessante do ponto de vista da sustentabilidade, pois é facilmente identificado como ecológico. Os consumidores percebem essa característica sem necessidade de explicações, e a reciclagem e a compostabilidade são possíveis no mundo todo.
As soluções Pulpex, Paboco e Ecologic, que reduzem consideravelmente o uso de plásticos, são interessantes para os produtos líquidos. Para os potes destinados a produtos de cuidados da pele, uma série de problemas técnicos precisam ser resolvidos. Uma possibilidade é fabricar um pote em resina de madeira, como fez a Sulapac, ou lançar uma solução inovadora, como a "conic", desenvolvida pela Holmen Iggesund. Mas a verdade é que, até hoje, ninguém conseguiu inventar o papel impermeável.
Além disso, o papel virgem não é necessariamente menos intensivo em carbono que o papel reciclado, se considerado o ciclo de vida útil como um todo. Seja qual for o tipo de material, seu impacto deve ser avaliado em todas as áreas para fins de verificação. Se o papel tiver mais de 70% de sua superfície recoberta de decoração metalizada, é possível que não possa ser reciclado. Quando se usa plástico superposto ao papel para impermeabilizar a embalagem, uma vez que o produto tenha acabado o plástico é descartado, e não reciclado.
Hoje, já começam a chegar ao mercado caixas de papel sem plástico termoformado. Uma tecnologia de polpa "moldada" à base de bambu, madeira ou outros resíduos vegetais abre caminho para novas soluções, mas ainda não sabemos qual o impacto desses novos materiais em termos de CO2, em comparação com o impacto do papelão – virgem ou reciclado – disponível atualmente.
Outro artigo que vem invadindo o mercado são as tampas de madeira sem insert ou com insert removível, o que facilita o descarte no final do ciclo de vida. A madeira oferece o tipo de sensação tátil que os consumidores atuais valorizam muito. Cabe notar que, na verdade, não existe uma cadeia de reciclagem para tampas de madeira. Elas podem ser queimadas ou integradas a um sistema de compostagem industrial. O volume de tampas de madeira no mercado não é muito alto e, com o tempo, elas se degradam completamente, constituindo, portanto, uma ótima opção.
De fato, as soluções em madeira ou em papel são biodegradáveis - desde que a decoração não seja excessiva – e por isso oferecem uma excelente pista a explorar para as marcas que desejam reforçar sua política ambiental. Mas não podemos esquecer que as soluções mais óbvias não são necessariamente as mais ecológicas ou as que menos produzem CO2. Vários parâmetros devem ser levados em conta na implementação de uma política ambiental.
Beleza acessível
Em linha com as tendências de "beleza inclusiva" e "diversidade" que surgiram nos últimos anos – e em favor das quais ainda há muito a fazer, diga-se de passagem –, estamos caminhando atualmente rumo ao conceito de "beleza acessível", em que o objetivo é oferecer artigos fáceis de manipular.
Tampas menos apertadas, escovas mais fáceis de usar, fechos ou suportes mais simples e instruções mais legíveis são algumas das opções que podem contribuir para tornar a beleza mais diversificada e acessível.
A fabricação dessas soluções em grande escala cria desafios técnicos, e a impressão aditiva talvez seja uma boa estratégia para comercializar linhas de produtos exclusivas em menores quantidades. A Olay está atualmente testando sua nova tampa acessível e, dentro de algum tempo, saberemos se ela será bem aceita no mercado. Outra marca que vem trabalhando nessa área é a Victorialand, nos Estados Unidos: a empresa lançou uma rotina de beleza com símbolos de leitura facilmente identificáveis, destinada especificamente a pessoas com deficiência visual que não leiam em braile.
Como todas as tendências mencionadas anteriormente, a beleza acessível deverá passar por testes e experiências a fim de determinar o melhor modelo. Vale também ressaltar que isso tudo terá um impacto sobre os padrões de beleza em geral, e que estamos ingressando numa era em que as imperfeições também entram em jogo. Hoje, a beleza deixou de ser uma ferramenta de julgamento, tornando-se mais holística e estreitamente ligada ao bem-estar.
Já pensaram que talvez o propósito da beleza seja conferir poder aos consumidores, em vez de sujeitá-los a padrões impossíveis de se respeitar? Ser ecológico significa também ser inclusivo.
Conclusão: manter-se realista e praticar a transparência
Um tema que não abordamos entre as tendências – por se tratar de um princípio subjacente a todas elas – é a TRANSPARÊNCIA. Não basta espalhar aos quatro ventos que a marca é do bem. As empresas deverão dar provas de seu empenho em favor da ecologia. Nessa área, a Blockchain dará uma contribuição valiosa, oferecendo uma ferramenta de verificação a toda a rede de abastecimento e de vendas no varejo.
De maneira geral, o uso de argumentos comerciais simples demais não ajuda em nada. Ao contrário: as promessas de "plástico zero" ou "resíduo zero" podem prejudicar todo o setor de beleza. É impossível fabricar uma bomba sem plástico. Portanto, quando uma empresa afirma que o uso desse material é excluído, ela não está sendo realista. Mas comprometer-se com a redução do volume de plásticos ou dos resíduos em geral é, sim, uma forma muito mais concreta para a marca demonstrar seu empenho.
Em suma, devemos adotar um posicionamento mais ponderado diante do mercado, explicando a situação atual da indústria e de que forma estamos trabalhando para alcançar o que almejamos em relação ao futuro. Por enquanto, não dispomos de uma solução perfeita. O Metaverso e o edutainement, ou educação com entretenimento, podem vir a ser uma excelente maneira de interagir com os consumidores, educá-los e desenvolver produtos junto com eles.
Talvez o primeiro passo seja educar-se a si mesmo para que a comunicação com o público seja mais clara.