Em um país de clima quente, extenso litoral e uma forte cultura de exposição ao sol, produtos de fotoproteção deveriam fazer parte da cesta básica da população. Não é o que acontece no Brasil. O país é o segundo maior mercado mundial da categoria, atrás apenas dos EUA, mas dados indicam que protetores solares são comprados menos de duas vezes por ano nos lares brasileiros.
Uma pesquisa realizada pela Kantar Worldpanel revelou que protetores solares e bronzeadores perderam espaço no país no último ano, tanto na penetração em domicílios quanto em volume. Em entrevista ao Brazil Beauty News, Leonardo Calegaro, executivo de contas da consultoria especializada em comportamento de consumo, fala da queda da categoria, especialmente entre a população de baixa renda, e das perspectivas de reaquecimento do mercado.
Brazil Beauty News - De acordo com a Kantar Worldpanel, protetores solares caíram 2,1% em penetração no mercado brasileiro entre outubro de 2016 e setembro de 2017, o que equivale a menos 900 mil domicílios no país. Quais são as razões da queda?
Leonardo Calegaro – É importante entender que, com a última crise vivida entre 2014 e 2015, as escolhas do brasileiro no momento de compra passaram por um processo de priorização e de relação custo-benefício. Categorias menos enraizadas na rotina dos compradores perderam relevância, como produtos faciais, cremes para o corpo e, não obstante, protetores solares. Ao longo de um período acumulado de quatro anos, a categoria consegue atingir em torno de metade da população domiciliar do país, mas quando olhamos essa taxa de penetração em apenas um ano, o número cai para menos de 20%. Com frequência de compra de 1,6 vez ao ano, fica evidente que protetores solares estão presentes nos lares brasileiros, mas não profundamente imersos em seu hábito de consumo.
Brazil Beauty News - Em volume, também houve retração no período analisado. Você aponta algum outro motivo para o resultado negativo?
Leonardo Calegaro - O mercado tem se reaquecido, mas ainda luta para voltar ao panorama pré-crise. O reaquecimento acontece de modo diferente entre as classes sociais, começando com quem mais tem acesso a produtos que implicam alto desembolso: as classes mais altas. Na outra ponta, as classes mais baixas continuam abandonando os protetores solares, o que explica o saldo negativo total.
Brazil Beauty News - Na região Nordeste do país, famosa por suas praias e temperaturas elevadas, o volume da categoria caiu 18,7% dentro do período. Já no Sul, onde as condições climáticas são bem mais amenas, houve aumento de 18,5%. Como você interpreta esses números?
Leonardo Calegaro - Cerca de 47% da população nordestina é da classe D/E. No Sul, este número é de apenas 14%. Entendendo o movimento da categoria atrelado às classes, fica simples entender que o ponto não é exatamente regional, mas socioeconômico.
Brazil Beauty News - Ainda de acordo com a pesquisa, as vendas de protetores solares cresceram 22,9% em farmácias, mas diminuíram nas vendas diretas (-17,6%) e no varejo tradicional (-24,4%). Há algum tipo de uma mudança de comportamento do consumidor?
Leonardo Calegaro - O canal é um reflexo de quem está comprando. Com o reaquecimento advindo de classes mais altas, são os canais mais frequentados por elas que registram desempenho mais positivo.
Brazil Beauty News - Segundo levantamento da Euromunitor, a expectativa é de que o mercado de fotoprotetores cresça 22,3% no Brasil nos próximos cinco anos. Você acredita nesta evolução?
Leonardo Calegaro - Ainda é muito recente para, só por meio da avaliação simples dos nossos dados, dimensionarmos o crescimento. Para isso, é preciso uma análise muito mais sofisticada e que envolva diversos fatores, até mesmo políticos. No entanto, é possível depreender duas linhas de trajetória, dada a situação atual: protetores devem continuar a se recuperar entre as classes mais altas e a indústria deve buscar novas formas de atingir novamente a população das camadas mais baixas.
Brazil Beauty News - Desde 2014, a Sociedade Brasileira de Dermatologia realiza a campanha “Dezembro Laranja”, alertando a população sobre o câncer da pele, o tipo mais comum no país, representando 30% dos tumores malignos. Você acredita que este tipo de ação possa contribuir para o aumento do consumo de protetor solar?
Leonardo Calegaro - Acredito fortemente que sim. O grande ponto é entender quanto e com quem. Isso dependerá de como a indústria se aproveitará dessa onda.