Uma fina película, mas que exerce a função essencial de proteção e equilíbrio
A função de barreira cutânea tem como principal suporte a camada córnea (também conhecida como stratum corneum, ou SC), que constitui a superfície mais externa da epiderme. A camada córnea é formada por queratinócitos altamente diferenciados, metabolicamente inativos e estreitamente interligados. Denominados corneócitos, esses elementos se encontram imersos numa matriz rica em lipídios e são constantemente renovados graças a queratinócitos indiferenciados que proliferam na camada basal da epiderme e, progressivamente, se diferenciam e migram em direção ao stratum corneum.
A camada córnea é estruturada em camadas empilhadas umas sobre as outras e pode ser descrita como um material compósito organizado em duas partes distintas, seguindo um modelo "brick and mortar". Esse sistema de "tijolo e cimento" apresenta uma estrutura proteica (corneócitos) incorporada a uma matriz lipídica (lipídios intercelulares).
Os desafios dos testes in vitro
A integridade da barreira cutânea pode ser avaliada tanto em explantes de tecido cutâneo como em modelos 3D de pele (epiderme ou espessura total). O efeito proporcionado por um ingrediente em um marcador específico pode também ser testado por meio de culturas de queratinócitos 2D (ou em cocultura com células imunitárias ou células neuronais capazes de modular a resposta dos queratinócitos).
Avaliação da eficácia da barreira cutânea
Normalmente, a barreira cutânea impede a passagem de diversos tipos de moléculas. Assim sendo, sua integridade pode ser avaliada ao se medir a perda de água transepidérmica (Trans Epidermal Water Loss - TEWL), a resistência elétrica transepitelial/transendotelial (TEER), ou a permeação de diversas moléculas através da epiderme, utilizando Célula de Franz (OCDE 428) ou outras técnicas de penetração percutânea.
Formação da barreira cutânea
A integridade da barreira cutânea requer que os processos de formação e renovação transcorram adequadamente, como resultado da proliferação, diferenciação e descamação dos queratinócitos. Por meio de diferentes biomarcadores, é possível avaliar a distribuição dos queratinócitos indiferenciados (K5, K14), sua linhagem (K15, K19), sua proliferação (Ki67) e seu gradiente de diferenciação (K1, K10, Loricrina, Involucrina, Filagrina).
Outros marcadores são igualmente dignos de interesse, como K6, K16 (reforçam a coesão célula-célula e célula-matriz), transglutaminases 1, 3 e 5 (controlam a reticulação covalente da involucrina e da loricrina), sirtuína 1 (controla a síntese da filagrina), caspase 14 (controla a degradação da filagrina) e calicreínas (envolvidas no processo de descamação).
A degradação da filagrina produz o Fator de Hidratação Natural (Natural Moisturizer Factor - NMF), elemento decisivo para que a pele se mantenha hidratada. Um nível de hidratação e um pH adequados garantem o bom funcionamento das enzimas cutâneas envolvidas na formação da camada córnea e na coesão celular.
Além de serem responsáveis pela aderência entre a derme e a epiderme, certos componentes da junção dermoepidérmica (JDE) – como a Laminina 332 (Laminina V), o colágeno de tipo IV, o nidógeno-1 & 2 e o Perlecano –, ou que permitem a fixação dos queratinócitos à JDE – como a Integrina α6 e β4 –, têm um impacto na sobrevivência, na linhagem, na proliferação e na diferenciação dos queratinócitos e, portanto, na função de barreira cutânea.
Compacidade das junções e integridade da pele
A compacidade das junções determina a coesão entre os corneócitos, na medida em que impede a passagem de diversas moléculas através do stratum corneum. A integridade das junções pode ser avaliada pela análise de Corneodesmosin, Zonula Occludens 1 (ZO1), Occludin, E-Cadherin, Desmoglein-1, Claudin 1.
A coesão da camada córnea mobiliza também proteínas como a envoplaquina e a periplaquina, que conectam as queratinas intracelulares às junções membranares e celulares.
Peptídeos antimicrobianos
A primeira linha de defesa contra agentes patógenos é formada pelos peptídeos antimicrobianos secretados na superfície da pele, entre os quais se encontram, por exemplo, a catelicidina humana LL-37, as β-defensinas de tipos 1-4, a psoriasina (S100A7), a calprotectina (S100 A8/9), a coebnerisina (S100A15) e a RNase 7.
Barreira lipídica da camada córnea
A composição e a organização dos lipídios também são muito importantes para a função de barreira cutânea. A espessura da epiderme, a espessura do stratum corneum e a organização dos lipídios podem ser avaliadas por meio da microspectroscopia Raman, ao passo que a composição dos lipídios é obtida usando cromatografia líquida, associada à espectrometria de massa de alta resolução. Com isso, é possível avaliar, em particular, a síntese, as subclasses e a organização das ceramidas.
Benefícios dos estudos in vivo
A função de barreira cutânea pode ser estudada em indivíduos utilizando diversos protocolos, entre os quais avaliação clínica por dermatologistas, avaliação por escore realizada por especialistas ou algoritmos de inteligência artificial, análise sensorial ou neurossensorial e avaliação instrumental. Os testes biometrológicos permitem visualizar a estrutura e a superfície da pele e quantificar seus diversos parâmetros fisiológicos.
Apresentamos a seguir um resumo dos métodos utilizados para caracterizar a integridade da barreira cutânea:
– Método de referência para medir a perda de água transepidérmica [TEWL] com o uso de dispositivos como Tewameter 300 e Nano (C+K), Aquaflux (Biox), Dermalab (Cortex), Evaporimeter, Vapometer etc.
– Condições de hidratação do stratum corneum: Corneometer® (C+K), Dermalab, Epsilon (Biox), MoistureMeter SC, Skicon-200, DPM 9003; da epiderme: MoistureMeterEpiD; e da derme: MoistureMeterD
– Análise microtopográfica: MoistureMap® (C+K), Epsilon (Biox)
– Visualização da superfície: Visioscan (C+K), SkinCam, SpectraCam, NomadCam (Newtone) Dermalab Video (Cortex), AEVA-HE2-M e Evasurf (Eotech), C-Cube (Pixience), Antera3D (Miravex), VideometerLab e todos os demais sistemas de câmera
– Visualização da estrutura: Ultrassons, Tomografia Óptica Multifotônica MPT Flex, Scanner, Vivascope e Vivosight e Microscopia Confocal Laser, Microscopia LC-OCT 3D, Espectrômetros Infravermelhos etc.
– Teor de água molecular com microscopia confocal LBRAM 800 e espectroscopia Raman gen2-SCA (RiverD)
– Equilíbrio do microbioma: 16S-qPCR, Ms/MS PCR, análise metabolômica
Ao longo dos anos, vários estudos contribuíram para uma melhor compreensão da função de barreira cutânea, com aportes das neurociências, da epigenética e das ciências cosméticas. Na plataforma clínica, são disponibilizados 40 métodos conduzidos por 138 laboratórios de testes espalhados por 38 países, a fim de objetivar o fortalecimento da barreira cutânea. É necessário desenvolver uma abordagem interdisciplinar essencial para avaliar o desempenho dos produtos cosméticos destinados a reforçar a barreira cutânea, de maneira a oferecer às consumidoras a garantia de eficácia de suas respectivas rotinas diárias de beleza.