No Brasil, cerca de 56% da população se autodeclara preta ou perda, segundo o IBGE, o que evidencia a grande demanda por produtos de beleza adequados a tons mais escuros de pele. Apesar de representar a maior fatia entre os consumidores brasileiros, essa população foi, durante muito tempo, negligenciada pelo mercado de beleza.
“Infelizmente, nosso país ainda se vale muito de valores herdados do colonialismo escravocrata. O fato de grandes marcas de beleza terem ignorado a população preta e parda no momento de fabricação de seus produtos é reflexo do racismo estrutural no Brasil. Foram escolhas mercadológicas e, sobretudo, racistas”, afirma Luiz Romancini, co-fundador da Creamy.
Padrões eurocentrados dominaram a indústria da beleza mundial, mas um movimento de inclusão começou a ganhar forças nos últimos anos. De acordo com a Circana, empresa global de dados para análise do comportamento de consumo, entre 2021 e 2024, o número de marcas com corretivos e bases em tons mais escuros cresceu 37%.
“Efeito Fenty” fez marcas olharem paras necessidades da pele negra
“É impossível tocar na temática sem citar o ‘efeito Fenty’. Quando a cantora Rihanna lançou a Fenty Beauty, em 2017, o portfólio contemplava 40 tonalidades de bases e corretivos (hoje são 50). Após este marco, marcas de beleza e skincare começaram a olhar mais para as necessidades específicas da pele negra e, de lá para cá, um portfólio mais amplo, se já não era, se tornou uma obrigação”, opina Romancini.
Para lançar o Stick Multifuncional, no final de 2024, a Creamy desenvolveu uma coleção com 19 tonalidades. “Considerando que a democratização do skincare é missão da marca, seria impossível criar um produto com cor sem considerar a ampla gama de tonalidades de peles de nosso país. Não faria sentido lançarmos com apenas seis cores, como grande parte dos players nacionais”, diz o co-fundador da Creamy. Ele conta que foi feito um estudo de mercado e chegaram a um número “saudável” para o primeiro item da marca no segmento. “Sabemos da diversidade de tons e subtons de pele no Brasil, logo, não descartamos a possibilidade de incluirmos mais cores no portfólio.”
A Boca Rosa é exemplo de diversidade no mercado nacional. Ao se tornar uma marca independente, no meio do ano passado, lançou uma base multifuncional em formato bastão com 50 opções de cores, a maior cartela brasileira. “No Brasil, temos 144 tonalidades de pele. Entendemos como é complexo encontrar uma base que realmente combine com o tom e subtom da pele brasileira, então pensamos em cada detalhe para que todos se sentissem representados”, afirma Bruna Viana, co-CEO da Boca Rosa Company.
Movimento é o início da correção de um erro histórico
Para o desenvolvimento da paleta de cores escuras do Stick Pele, a Boca Rosa teve consultoria de Tássio Santos. “Ele é uma verdadeira referência em pele negra e sua expertise foi crucial na criação de 28 das 50 tonalidades, garantindo que cada uma refletisse fielmente as nuances da pele retinta. Criar produtos para pele negra não é um ato heroico, mas sim o início da correção de um erro histórico”, ela declara.
A Avon, líder em maquiagem no Brasil, tem investido em pesquisas nos últimos anos para ampliar os tons em todo seu portfólio. Não apenas de bases, pós e corretivos, mas também de produtos como blushes, sombras e batons adequados à pele preta e parda.
Juliana Barros, diretora de comunicação e marketing da Avon Brasil, conta que a empresa lançou em 2020 o movimento #EssaéMinhaCor, tendo como base dados de uma pesquisa realizada em parceria com a Grimpa. O estudo revelou que 70% das mulheres negras não estavam satisfeitas com as maquiagens no mercado, com 46% desistindo de comprar bases e corretivos por falta de tons compatíveis com a pele.
“Diante disso, os times de pesquisa e inovação da Avon se uniram à maquiadora Daniele Damata, especialista em pele negra, para uma revisão de portfólio e desenvolvimento de uma nova paleta mais inclusiva”, diz Barros. A linha Color Trend foi ampliada com opções focadas em pele negra, os batons Ultra ganharam novas versões após um estudo de colorimetria, já a coleção Power Stay chegou a 20 tonalidades de bases, com 11 específicas para peles negras. “Seguimos trabalhando ativamente para que cada mulher brasileira se sinta contemplada e, mais que isso, tenha variedade de opções de make.”